domingo, 25 de dezembro de 2016

A ESTRESSANTE VIDA NA MATA


Premido pelas circunstâncias, fui morar por alguns meses num lugar cheio de mata virgem por todos os lados, afastado da cidade. 

Nasci e me criei na cidade. Nunca morara sequer num sítio antes. Pensei, no início, que ia viver em paz. Ilusão! Não sei como uma pessoa pode viver naquele ambiente! Vejam alguns itens que anotei:

1- Noite após noite, faça lua (quando é pior) ou chova, você tem que dormir com barulho infernal de sapos, grilos, gaviões, pássaros noturnos, ressoando em seus ouvidos, SEM NENHUM BOTÃO PARA DESLIGAR!

2- Durante o dia, ou você gasta todo o seu salário em repelentes, ou fica de calça, meia e camisa de manga comprida o dia todo, por causa dos pernilongos. Contei cinco espécies desses bichinhos. Motucas, três espécies, e sempre atacam em meia dúzia. Borrachudos, contei dez espécies diferentes. Você quer escrever, por exemplo, ou rezar, ou mesmo trabalhar, e não consegue, pois fica lutando ingloriamente contra essas criaturinhas de Deus. Diz o livro da Sabedoria que Deus ama tudo o que criou, pois, se houvesse alguma criatura da qual ele não gostasse, não a teria criado!(Sabedoria 11,23-24). Outra alternativa é deixá-los à vontade e oferecer aquela dorzinha chatíssima para reparação dos pecados!

3- O calor é tão forte que você precisa tomar banho de rio (há ali um rio caudaloso, de águas cristalinas, sem barro nenhum, só com cascalhos e pedrinhas no fundo, a 8 metros da casa várias vezes por dia. Você deve estar pensando "que delícia!" Engano seu! Uma nuvem de pernilongos e mutucas de 2 cm de tamanho fica rodeando sua cabeça e suas costas e, logo que você sai da água, também os seus pés.

4- De manhã você lava o rosto e escova os dentes no rio (depois de se estapear várias vezes para matar os borrachudos de plantão) e vai tirar leite da vaca. Se você não levar nenhum coice, vai ter de ferver todo o leite. Na cidade, ele já vem prontinho! O vasilhame fica com aquela nata grossa colada, e leva meia hora para lavá-la, pois lembrem-se de que a pia é o próprio rio!

5- Cansado de lutar contra vacas, pernilongos, mutucas, borrachudos, você resolve dar um passeio na mata. Terá que enfrentar um mato o(a) cobre até o peito, e matar umas duas ou três cobras pelo caminho, atravessar regatos, escorregar e se esborrachar na lama, atolar os pés nos atoleiros...
6- Você resolve dar um passeio até a cidade: não há ônibus! Terá que andar seis quilômetros numa estrada de terra, sob um sol escaldante, suando bicas. E, na estrada, as mutucas fazem questão de ficarem circulando ao redor de sua cabeça até a cidade!

7- Chegando da cidade, com fome, você vai fazer comida: acabou o gás! Não há outro jeito: vai ter que acender o fogão a lenha. Meia hora depois de tentar, você consegue acender o fogo. A comida fica uma delícia, mas... você já tentou lavar no rio as panelas com fuligem de fogão à lenha? E as mãos? Lembro que é proibido usar detergente no rio!

8- Finalmente, você vai dormir: tem que fechar portas e janelas para não ser sugado pelos inúmeros insetos criados por Deus. Você é acordado de madrugada, com a vaca mugindo sob sua janela ou com o galo cantando desesperado! 

Chego a algumas conclusões:

1- Viver a pobreza não é viver numa carência dessas, mas aprender a usar bem os bens materiais e partilhar: Jesus utilizou tudo o que havia de melhor em seu tempo para seu apostolado, sem contar que sua roupa foi disputada no palitinho pelos soldados. Quantos fariam o mesmo para ficar com a minha roupa?

2- Viver na natureza até que pode ser bom, mas devidamente melhorada e transformada pela nossa capacidade de adaptação, pelas nossas invenções. A natureza na e crua, acreditem-me, é estressante!

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