sábado, 4 de janeiro de 2020

COMO EU ENTENDO A VIDA EREMÍTICA




04/01/2020

Que tipo de vida Jesus vivia?

Decerto, ele nunca foi eremita nesse sentido que nós conhecemos. Jesus nunca viveu isolado: nasceu numa cocheira, mas no meio de um casal; viveu pobre, em Nazaré, mas em família. Nunca se isolou da sociedade, a não ser naqueles 40 dias de deserto.

Vivia uma vida normal, mesmo quando iniciou sua vida de pregação, vivendo os percalços e os sofrimentos do dia a dia. Ele se isolava, sim, mas à noite, ou em alguma outra hora do dia em que se via livre da multidão. Durante sua vida de Nazaré não tinha muito tempo livre, pois tinha que trabalhar com José na carpintaria. Talvez tenha vindo daí o seu costume de rezar de madrugada...


Tendo isso em vista, pergunto: Se quisermos imitar Jesus, será correto nos isolarmos de tudo e de todos? Não é isso que ele fez!


Já publiquei um artigo sobre o que várias pessoas santas disseram sobre os perigos do isolamento: São Bento, por exemplo, que após vários anos no isolamento fundou os beneditinos para viverem em comunidade, justamente para evitar o isolamento.

O monge escritor Thomas Merton é outro que alerta: “O ascetismo do falso solitário é sempre falso (...). A nossa reclusão, enquanto for imperfeita, há de tingir-se de amargura e desgosto, porque nos esgotará por um constante conflito. O aborrecimento é inevitável. A amargura, que não devia haver, está lá, no entanto. (...) O verdadeiro solitário tem de reconhecer a sua obrigação de amar as pessoas e as criaturas de Deus (...), é um dever que não é nunca amargo” (Homem Algum é Uma Ilha, pág 211).


Diz também Bernardim Schellemberger, monge trapista alemão exclaustrado e pároco de uma aldeia de periferia: "A pura vida contemplativa facilmente nos leva demais para a inatividade ou, o que falando nos devidos termos, ainda é pior, a nos absorver com atividades objetivas e relativamente fúteis, ameaçando a perda duma visão acurada. Por outro lado, uma vida puramente ativa nos leva, mais dia menos dia, à superficialidade e à ignorância e, finalmente, a um ativismo estéril".


Ou seja: eu penso que o melhor é viver uma vida em que Marta e Maria estejam presentes, ou seja, que haja fortes momentos de contemplação e oração, deixando espaço para um certo convívio social-comunitário.


Afinal, Mateus 25, 31-46 diz que o julgamento final vai ser feito na base das obras de misericórdia: Eu estive com fome e me destes de comer, com sede e me destes de beber, estava nu e me vestistes, forasteiro e me acolhestes, estava doente e preso e me visitastes etc. Isso é completado com Tiago 2,14-26: A fé, sem as obras, é morta.


Se nós nos isolarmos não vamos conseguir fazer nada disso. E como fica nosso julgamento final?


Por isso eu percebo que muitas pessoas que buscam o eremitismo, na verdade estão fugindo de algo: ou de si mesmos, ou das responsabilidades, ou do trabalho, ou de qualquer outra coisa.


Também se confunde muito solteirismo com eremitismo. O (a) eremita não é um (a) solteirão (ona) despreocupado(a) e desligado(a). Ele (ela) é uma pessoa que se doa a Deus de corpo e alma, e não há como se doar a Deus se não se doar aos irmãos, já dizia São João em suas cartas.


Às vezes tenho buscado na Internet algumas coisas sobre eremitas, e muitas das que eu vejo são aberrações, pessoas que buscam apenas o prazer e a “dolce vita”, sem compromisso algum com a Igreja ou com uma comunidade.


Uma coisa que prezo muito num ou numa eremita é o desapego pelos bens materiais e a confiança na Providência Divina. Num (a) eremita não deve haver preocupação fora do comum pelo dinheiro. Vocês mesmos julguem: é normal um eremita colocar em seu celular um papel de parede com fotografia de dólares? Quem de vocês já teve essa ideia? Pois quem fizesse isso, poderia ser chamado de uma pessoa descompromissada com a preocupação demasiada com o dinheiro?


Eu resolvi escrever este artigo porque hoje de manhã, após a missa num mosteiro beneditino da cidade, o monge que celebrou precisou fechar a igreja (eu tinha acabado de fazer a Hora Santa) e começamos a conversar sobre a vida eremítica. Ele me falou que após os 60 anos pensa em viver uma vida eremítica, mas o mais perto possível da autenticidade: casa pequena e simples, sem internet, sem celulares...


É claro que eu lhe disse que ele estava “viajando na maionese”, pois isso é difícil conseguir hoje em dia. Também porque ele “se traiu” ao descrever como seria a casinha: de tijolos a vista, com isto aqui, aquilo ali... Aí eu lhe chamei a atenção: “Veja que o senhor já está começando a sofisticar a tal de casinha”.


Eu acho que o uso moderado da internet e da televisão não faz mal algum ao (à) eremita, se bem e pouco usadas e, aliás, até pode ajudar nas pesquisas, nas orações, no intercâmbio de ideias, na ajuda mútua etc.


Eu sou muito limitado em minhas opções pessoais. Sempre coloco isso nas minhas orações, e digo ao Senhor que não vou ser muito radical para não acabar “quebrando” e voltando à estaca zero. Se formos muito radicais em nossas opções e não buscarmos a ajuda de Deus, podemos desanimar ou mesmo cair em depressão, e aí a coisa se encrespa mesmo.


Podemos, sim, chegar a uma grande perfeição nas renúncias pessoais, mas acho que deve ser feito paulatinamente, aos poucos, sem esperarmos muitos progressos em pouco tempo.


Aprecio muito um texto que vi na Gaudium Press. Fala de 5 formas de se viver como monge, mesmo sem sê-lo. Eis um resumo:


1- Cultivar o silêncio. “Desligar a música e o rádio, por exemplo, quando está no carro, moderar o uso da televisão ou da internet, poderá ser a ocasião para escutar a Deus e permitir-lhe que fale no fundo do coração”.


2- Ser fiel à oração diária. Rezar de manhã e à noite. Rezar o Ofício das Horas. Durante o dia fazer breves orações de confiança em Deus.


3- Formar uma comunidade autêntica (com quem você vive, trabalha ou na comunidade paroquial): “Você deve estar disposto a investir o tempo e a energia para comprometer-se pessoalmente com outras pessoas e mostrar interesse em suas vidas”.


4- Evitar a ociosidade. Encontrar tempo diário para a “Lectio Divina”.


5- A prática da humildade. Somos criaturas, e não Deus.”A humildade é uma virtude que necessita ser desenvolvida, e implica ser sensato, honesto e sincero, tanto na oração, no trabalho e nos assuntos cotidianos".


Outra coisa ridícula e maldosa que tenho visto em alguns sites de vida eremítica é a repulsa ao Papa Francisco. Isso é coisa demoníaca! O Papa Francisco é o legítimo sucessor de São Pedro. Precisamos rezar por ele e apoiá-lo em seu pastoreio, caso contrário cairemos no mesmo pecado dos fariseus e demais autoridades do tempo de Jesus, que não o aceitavam por conta da atualização que ele estava fazendo da religião deles. E lembro que esse pecado é contra o Espírito Santo e não tem perdão nem aqui nem na vida eterna, segundo o próprio Jesus disse. O demônio está “deitando e rolando” com esse pecado que muitos estão cometendo.


Afinal, acreditamos ou não que Jesus estará com sua Igreja até o fim dos tempos?

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